Macrobiótica
Por: Francisco Varatojo
Instituto Macrobiótico de Portugal
https://institutomacrobiotico.com/blog/2023/11/21/macrobiotica/
Neste artigo tentarei elucidar os leitores sobre o que são a alimentação e
o estilo de vida macrobióticos, uma vez que me parece haver uma certa confusão
por parte do público em geral sobre que é e o que não é este modo de vida. Leio
com alguma frequência, críticas à prática alimentar macrobiótica, que não têm
muitas das vezes qualquer fundamento dum ponto de vista nutricional, por mero
desconhecimento técnico por parte de quem escreve a crítica.
Existe também a ideia de que a Macrobiótica e o vegetarianismo se regem
pelos mesmos princípios, o que também não é verdade – o regime macrobiótico
sendo predominantemente de origem vegetal, não é necessariamente um regime
vegetariano; o uso de produtos animais (preferivelmente peixe) é aceitável e
nalguns casos necessário dependente de factores como o clima, grau de
actividade física, antecedentes biológicos e outros.
A Macrobiótica não é exclusivamente uma dieta, um regime, mas sim um estilo
de vida que tem como objectivo último ajudar-nos a desenvolver o nosso
potencial humano, ao seguirmos as leis da natureza dum ponto de vista biológico
(através da alimentação), ecológico (fazendo escolhas diárias que contribuem
para uma melhor qualidade de vida ambiental), social e espiritual (tratando os
outros com amor e compaixão e assumindo a nossa responsabilidade como um
pequeno elo numa vasta cadeia de seres e fenómenos).
A origem da palavra é grega, “macro” – grande – e “bio” – vida e não
significa apenas “grande vida” mas também a capacidade de vivermos a vida duma
forma grandiosa e magnífica. A esse nível, a alimentação é importante,
essencial, porque nos dá a base biológica, a saúde para gozarmos a vida em todo
o seu esplendor e para termos sensibilidade para com o meio que nos rodeia. Nós
somos literalmente o que comemos, os alimentos criam o nosso sangue que vai
nutrir as células, os órgãos, o cérebro. Sem alimentos a vida não é possível.
A palavra Macrobiótica foi utilizada por filósofos gregos como Hipócrates e
na era moderna primeiro no séc. XVIII por um professor de medicina alemão,
médico pessoal de Goethe, chamado Christoph Von Hufeland que escreveu o livro
“Macrobiótica, ou a Arte de prolongar a Vida” onde prescreveu recomendações
muito semelhantes às da “macrobiótica moderna”. Nos finais do séc. XIX, um
médico do exército japonês, Sagen Ishisuka, que se curou duma doença de rins
intratável pela medicina moderna, adoptando um regime alimentar baseado em
cereais integrais e vegetais, fundou a primeira organização macrobiótica
denominada na altura Sokuiokai e foi extremamente famoso no Japão nos finais do
séc. XIX e início do séc. XX.
Para Ishizuka todos os problemas de saúde e sociais tinham como origem uma
má nutrição, particularmente um desequilíbrio entre sódio e potássio nos
alimentos e, para ele, todos os problemas podiam ser corrigidos adoptando uma
prática alimentar de acordo com a constituição biológica humana, em especial a
utilização de cereais integrais e vegetais como alimentos principais.
O trabalho de Ishizuka foi continuado e desenvolvido por George Ohsawa que
nos anos 30 trouxe os seus ensinamentos para a Europa, em especial para a
França e Bélgica; Ohsawa escreveu dezenas de livros e foi relativamente
conhecido em França, mas duma forma geral, o que se conhece mais da abordagem
de George Ohsawa é uma prática alimentar macrobiótica extremamente restritiva
que não se adapta bem (na minha opinião) à vida moderna. Isto, apesar de Ohsawa
ter uma concepção extremamente alargada do regime macrobiótico, recomendando
desde dietas muito simples, monodietas, até regimes com uma quantidade
aceitável de produtos animais e pequena quantidade de bebidas alcoólicas.
Ohsawa prescrevia segundo a condição individual – para ele, praticar
macrobiótica era comer segundo as necessidades em constante mutação de cada um
– para algumas pessoas jejuar é a terapia, para outros comer bastante variedade
e divertir-se é a solução mais indicada. No entanto, na prática diária, os
cereais integrais e os vegetais continuam a ser os alimentos mais adaptados à
espécie humana, e consequentemente aqueles que mais ajudam a criar e a manter a
saúde.
Os ensinamentos de George Ohsawa foram na geração seguinte disseminados
pelos seus discípulos orientais particularmente Michio e Aveline Kushi, Herman
e Cornelia Aihara, Tomio e Bernardete Kikuchi, Shizuko Yamamoto, Clim Yoshimi,
entre outros e na geração actual especialmente por estudiosos europeus e
americanos. Michio Kushi, residente nos Estados Unidos desenvolveu um modelo
alimentar mais simples de compreender e mais adaptado à vida moderna denominado
“Alimentação Macrobiótica Padrão” (Standard Macrobiotic Diet), o modelo
alimentar mais utilizado pela maioria dos praticantes macrobióticos modernos.
Nas linhas que me restam para concluir este artigo, vou tentar identificar
aqueles que me aparecem ser os aspectos mais importantes da alimentação e
estilo de vida macrobióticos.
Devemos comer segundo as nossas características biológicas – o Homem é por
natureza um ser designado para comer maioritariamente alimentos de origem
vegetal, em particular cereais e vegetais, apesar de ter a capacidade para
ingerir de tudo.
A alimentação deve reflectir o enquadramento geográfico e climático pelo se
deve adaptar aos diferentes climas e habitats; deve também ser tradicional, ou
seja devemos escolher um estilo alimentar que venha a ser seguido há séculos
(os cereais, os vegetais e as leguminosas foram a base alimentar da espécie
humana durante milhares de anos e só recentemente esses hábitos foram
alterados).
A noção de bipolaridade, ou a teoria de “yin” e “yang” é uma parte essencial
deste estilo de vida – a ideia de que todos os fenómenos, alimentos incluídos,
têm qualidades energéticas, metafísicas e de que a harmonia relativa é
conseguida quando “equilibramos” estes dois pólos, yin e yang, nas nossas
vidas.
Temos o livre arbítrio para escolhermos comer e viver como quisermos, mas há
uma responsabilidade inerente a cada uma das escolhas que fazemos; não existem
alimentos proibidos mas existe um critério a partir do qual podemos escolher
duma forma mais responsável e consciente.
Essencialmente, na prática da Macrobiótica, a saúde e a felicidade começam
em cada um de nós, e as nossas vidas são em grande parte, um reflexo das nossas
escolhas e prioridades.
Espero que com este artigo passe a ter uma ideia mais alargada e mais
acertada do que significa praticar macrobiótica; oportunamente escreverei sobre
os aspectos mais técnicos e nutricionais desta prática alimentar.