CONVENCER SEM FALAR
Dr.
Martín Macedo
O
povo Hunza foi descoberto em 1910 pelo médico britânico Mac Carrison.
Constituído por 30.000 habitantes distribuídos por pequenas aldeias, os Hunza
vivem a uma altitude média de 2.000 metros acima do nível do mar, no extremo
Norte do Paquistão, próximo da fronteira com a Índia, Tibete e Rússia. Apesar
de estarem rodeados por povos asiáticos os seus traços físicos, segundo os
observadores correspondem aos de um europeu médio. Diz-se que um grupo de
sobreviventes do exército de Alexandre Magno se refugiou nesta zona montanhosa,
de muito difícil acesso e ali se estabeleceram. Estão totalmente isolados de
outras regiões povoadas. Têm de percorrer 500 Km de distância para chegar a um
centro povoado e como viajam a pé a dita viagem leva-lhes cerca de um mês a
percorrer. Agarram-se obstinadamente ao seu modo de vida e costumes. Mac
Carrison tendo feito um levantamento da situação sanitária das colónias
britânicas na Índia, chegou a esta zona limítrofe e não encontrou ali nada que
lhe chamasse a atenção. Como quase todos os outros médicos procurava registar
as doenças prevalecentes nos povos que visitava. E no povo Hunza não havia
nenhum doente. No entanto, muitos anos depois, reflectindo sobre a inexplicável
ausência de doenças nessa região do mundo, voltou e investigou a fundo o seu
modo de vida, procurando uma explicação para esta surpreendente ausência de
doenças. Esta gente vivia com facilidade até aos 120 anos e inclusivamente até
aos 140 anos. Os homens procriavam até aos 75 anos e os anciãos não viam
diminuir nem a sua visão nem a audição. Mantinham a sua dentadura intacta
apesar da sua idade avançada e ocupavam-se dos trabalhos agrícolas com um
coração forte até aos 110 anos. Não existiam doenças mentais e salvo alguma
fractura ou febre curta e intensa, como pôde constatar, nunca adoeciam. O seu
carácter era alegre e conciliador. Segundo os relatos de Mac Carrinson não se
encontraram condutas criminosas entre os Hunza. Esta gente gozava de uma saúde
extraordinária, muito superior à saúde média no mundo desenvolvido. Existe um
filme que mostra o povo Hunza. Tornaram-se famosos cerca de 1960 quando
começaram a chegar turistas e curiosos de todas as partes do mundo. Como Mac
Marrison estava convencido que esta saúde extraordinária se devia ao modo de
alimentação deste povo decidiu quando regressou a Inglaterra fazer uma
experiência dietética, para provar a sua teoria. Alimentou dois grupos de ratos
com dois tipos de dietas diferentes: a um grupo com a dieta típica londrina e
ao outro grupo com a dieta Hunza. O primeiro grupo de 1.200 ratos foi
alimentado com pão branco, pratos doces, à base de farinha branca, compotas,
carne, arenque, conservas, guloseimas e de vez em quando com leguminosas. A
seguir a um tempo bastante prolongado desenvolveram as mesmas doenças crónicas
dos londrinos, comprovando que também se tornavam agitados e agressivos. Alguns
destes ratos acabaram por se devorar entre si.
Por
outro lado, o outro grupo foi alimentado com alimentos típicos dos Hunza: trigo
sarraceno, millet, trigo, cevada, lentilhas, damascos, maçãs, uvas, papas e
muito pouca carne. Comprovou que no mesmo período de tempo estes gozavam de
excelente saúde, reinando entre eles o entendimento. O seu comportamento era
pacífico em comparação com o grupo nutrido com uma típica dieta urbana.
Os
Hunza nunca adoecem. Se alguém visitar esta zona do mundo ou vir o filme não
necessita ser convencido da eficácia do seu sistema de vida. Eles convencem sem
falar. Não só pela sua extraordinária imunidade e fortaleza, mas também pelo
seu carácter alegre e conciliador. Não há conflitos sérios entre eles. Parece
um paraíso. Porém é real. Este nível de saúde não se encontra salvo raríssimos
casos no mundo moderno. O que consideramos “saúde” no sentido comum é algo bem
ténue comparado com a fortaleza extraordinária dos Hunza. Porque nunca adoecem.
Nem um resfriado, nem uma gripe. As infecções provocadas por feridas ou outras
causas curam-se sem medicamentos. Se tivermos um resfriado uma vez no ano ou se
tivermos uma gripe em cada 6 meses estamos abaixo do nível de saúde dos Hunza.
Se tivermos depressões ou ataques de pânico ou se nos cansarmos ao subir uma
escada não estamos bem. Não convenceremos ninguém por mais que nos alimentemos
com cereais em grão e outros alimentos saudáveis. Quem tem um tipo de saúde assim
catequiza com o exemplo e não precisa de falar. O seu testemunho vivo é muito
eloquente. A nossa macrobiótica é essencialmente similar ao sistema alimentar
dos Hunza. Se a seguirmos firmemente não deveríamos adoecer nunca, ainda que
ocasionalmente haja desvios. Até mesmo com desvios a nossa solidez física
deveria ser para nunca adoecer. Devemos chegar a este nível de vitalidade para
conseguir convencer sem falar. Os Hunza têm pouco dinheiro e empregam-no para
adquirir tecidos e ferramentas para o seu trabalho. Eles trabalham duro
fisicamente e não têm as facilidades da vida urbana. Mas nós somos citadinos.
Estamos rodeados de ajudas técnicas que “elevam o nosso nível de vida” e o de
um sem número de alimentos falsificados. Somos pressionados socialmente para
que os consumamos e a publicidade empurra-nos constantemente para que entremos
no carrossel do consumismo. Mas se formos capazes de atingir o nível de saúde
dos Hunza vivendo em centros urbanos então somos mil vezes maiores que os
Hunza. Esse é o nosso objectivo. Seremos mil vezes mais felizes que eles se
conseguirmos viver em sociedade e ao mesmo tempo ter um nível de saúde
extraordinário. Para isso necessitamos de uma enorme vontade. E temo-la em
estado embrionário. Se não desenvolvermos a vontade, a prática da macrobiótica
terá pouca eficácia. O ideal seria primeiro educar a vontade e depois iniciar a
macrobiótica. Mas às vezes não há tempo e devemos fazer as duas coisas ao mesmo
tempo. Então, se tivermos êxito seremos realmente grandes. Por isso a glória
macrobiótica é tão gloriosa. A vontade é uma força. Essa força pode aumentar ou
diminuir. Sempre há duas opções e como tudo muda não podemos viver sem optar. A
vontade faz parte da vida. Quem tem vida tem vontade. Vitalidade é vontade. As
pessoas com mais vitalidade são mais voluntariosas. Mas ninguém carece
completamente de vontade, a menos que esteja morto. A vontade surge da tomada
de consciência. Os mestres espirituais hindus, dizem que a vontade aumenta com
a atenção. Estar atentos ao que estamos fazendo é um exercício de vontade. E a
meditação é exercício da atenção, porque devemos atender à respiração e à
postura. Podemos estar atentos se decidirmos fazê-lo. Ao exercitar a atenção
fortalecemos a vontade. A cada momento estamos a decidir ao que vamos prestar a
nossa atenção. Se concentrarmos a nossa atenção na cura obteremos a cura. A
necessidade premente de nos curarmos obriga-nos a concentrar as nossas forças
interiores (atenção e vontade) no processo curativo. Por isso Ohsawa dizia que
os doentes graves se curavam mais depressa que os doentes leves. Porque
praticam mais seriamente. Então, a doença é uma grande oportunidade, e
deveríamos vê-la assim. Cada vez que temos uma crise, surge uma forte
determinação de a superar. Portanto, crise é progresso. Se procuramos uma vida
fácil e cómoda as nossas forças interiores dispersarão. Só através das
dificuldades surgem as nossas grandiosas forças interiores que nos permitem
alcançar os nossos sonhos. Todos fogem do difícil. Mas devemos aceitá-las como
prendas do céu. Só nas profundezas das dificuldades encontraremos o manancial
da nossa força infinita. E como as situações difíceis abundam, devemos
aproveitá-las para temperar a nossa vontade. Face a uma dificuldade, podemos
fugir ou podemos aceitar. É nossa a escolha. Quem tem sabedoria compreende que
o avião só levanta voo com o vento contra. Se quisermos subir alto na vida,
devemos aproveitar os ventos contrários e não nos cansarmos de dar graças.
Porque estes ventos difíceis são a origem da nossa força invencível. E como no
Universo não há limites, a nossa força tão pouco conhece limites. Podemos ser
tão grandes como decidamos sê-lo, porque a nossa vida é infinita. Então,
poderemos convencer sem falar.