Que comer e como
fazê-lo
Na natureza existe uma ordem. Cada forma de vida
necessita alimentar-se para continuar com a sua existência. Água, Sol,
proteínas, minerais e outros nutrientes. Todas as formas de vida alimentam-se.
Alimento é energia. Fonte de energia vital. E cada organismo está especializado
para fazê-lo de uma forma única. Este processo de diversificação e especialização
para a absorção do alimento é o resultado de enormes e extensos períodos.
Milhares e milhares de anos de evolução das
diferentes formas vivas.
Assim, na família das aves, os pinguins estão
adaptados a uma dieta de peixe e todo o seu corpo está perfeitamente desenhado
para capturar peixe e assimilá-lo com suprema perfeição. A águia também é uma
ave, uma prima irmã do pinguim, porém a evolução biológica de milhões de anos,
gerou outro tipo de corpo perfeitamente adaptado à localização a grandes
distâncias de pequenas presas e à sua posterior captura com ferozes garras.
Pela sua parte, o colibri, também da família das aves, evoluiu como consumidor
de pólen e busca nas flores a sua alimentação.
Todas são aves e cada uma limita-se àquilo que lhe
toca dentro da ordem da vida. Como consequência não ficam doentes. E essa é uma
manifestação da imensa “sabedoria” do instinto de sobrevivência dos animais
vivendo em plena natureza.
O ser humano, também é um animal, e apesar de
estar mais bem-dotado na evolução biológica, não está isento de respeitar
aquelas normas da alimentação biológica. Todos os pinguins se alimentam na base
do peixe, todos os búfalos se alimentam na base das ervas selvagens e todos os
gorilas se alimentam na base de plantas e de frutos. E todos são felizes e
saudáveis. Não há queixas nem protestos.
Quando o homem intervém querendo “ajudar” os
animais fogem, não querem sair do paraíso no qual as suas espécies têm vivido
felizes durante centenas de milhares de anos. Mas o ser humano crê-se muito
preparado e dá aos animais alimentos “enriquecidos”, “melhorados” para que
tenham um pelo mais bonito e forte e para melhorar o seu estado nutricional. E
dá aos cães alimentos ricos em vitamina A e D, para melhorar esta ou aquela
função biológica.
O homem por mais ilustre
que seja é regido pelos mesmos princípios e as mesmas leis biológicas. Não
deveria comer “de tudo”, simplesmente porque está saudável, ou porque “tudo lhe
cai bem”. A anarquia, a desobediência à ordem natural é o que conduz à degeneração
biológica e à eclosão de legiões de doentes crónicos. A macrobiótica
convida-nos a descobrir os alimentos correctos na escala biológica e a como
prepará-los e consumi-los todos os dias com prazer e gratidão.
Quanto ao que comer, a sugestão é utilizar os
produtos que foram usados tradicionalmente no local. Mas alimentação
tradicional não significa o que se tem usado nos últimos 200 ou 300 anos, mas sim
o que se usou como alimento típico durante milhares de anos. Atualmente há
muita confusão e já ninguém sabe com clareza o que é tradicional e o que é
copiado de outras culturas. O ser humano adapta-se a todos os climas e a todas
as latitudes.
Em zonas desérticas
alimenta-se na base de leite de camelo e frutos que encontra no oásis. Essa é a
forma que tiveram durante centenas de anos e seguem-na devotamente, acreditando
que a sua raça e a sua cultura obtêm a sua força e energia destas tradições. Se
os beduínos entrarem em contacto com a dieta das cidades e começarem a
consumi-la habitualmente, perdem a sua base, a sua raiz e começam o seu
declínio e a sua extinção.
Ao longo da história as
grandes aglomerações humanas alimentaram-se de cereais. Arroz e trigo sarraceno
na Ásia, millet e bulgur em África, trigo, cevada e aveia na Europa e no Médio
Oriente e milho, quinoa e amaranto nas três Américas.
Os cereais têm sido a base da alimentação humana
durante milhares de anos e nas zonas onde se cultivaram cereais floresceu a
cultura e o desenvolvimento das ciências e tradições religiosas. Nas zonas onde
os humanos se alimentaram de carnes (caça e recolecção) e frutos, a evolução
intelectual-espiritual parou no Neolítico.
No pólo Norte, nas selvas tropicais e nas savanas africanas vivem
robustos seres humanos que vivem da caça e recolecção, mas não consomem cereais
como alimento base. Contudo não têm um calendário nem mapas das estrelas e
astros do céu. Nem sequer têm escrita. Os cereais foram os geradores do
desenvolvimento da humanidade. Não só trazem a saúde e a força para desenvolver
e progredir para novos desafios, mas também permitem a conexão com as forças
subtis que não chegam aos que se alimentam basicamente de corpos cozinhados de
outros animais.
O ser humano ideal não é
carnívoro nem vegetariano, mas sim “granívoro”. Por isso a nossa sugestão é a
alimentação à base de cereais em grão integrais. Algumas culturas conservaram
ferreamente a sua tradição da alimentação à base de cereais. Na Ásia a base é o
arroz. Para os asiáticos o arroz é sagrado e por isso consomem-no em todas as
refeições. Creem que os protegem das doenças e sustenta a sua peculiar
tenacidade e espírito colectivo. Também os japoneses inconscientemente
aferram-se às suas tradições dietéticas face à invasão das modas dietéticas
europeias e dos estados unidos da América.
A base sempre foi o cereal. Um prato tradicional chinês, japonês ou
indiano, tem como base o arroz, vegetais e proteínas vegetais e animais. Muita
pouca carne e derivados animais. Ausência quase completa de leite e derivados
do leite. A dieta é 80-90% de origem vegetal. Alguns pratos crus e a maioria
são cozinhados segundo receitas tradicionais. Na América indígena a base sempre
foi o milho, feijões, vegetais como batatas e outras hortícolas, especiarias e
também pouca carne e derivados animais.
Actualmente, come-se na base da proteína animal. Perdeu-se a noção da base, do
alimento principal. É esse o grande erro. E por isso a medicina só consegue
alívios parciais e curas de duração efémera. A base é o cereal. O precioso
cereal deveria ser 50-60% das nossas principais refeições. Porém, é
imprescindível que seja integral e sempre que possível de cultivo orgânico (ou
pelo menos não transgénico). Na maior parte dos países do mundo a soja e o
milho são transgénicos. Aos meus irmãos latinos, e apesar de que a tradição
indique que a base é o milho, desaconselho o seu consumo, a menos que seja
evidente que a sua procedência seja de produção orgânica. No Uruguai 99% do
milho que se vende em forma de farinha de milho ou fécula de milho ou óleo de
milho ou em forma de choclos frescos têm origem transgénica. Os estudos
e investigações científicas independentes indicam que produzem tumores em
ratos. Mas os governos não dizem nada nem sequer rotulam as embalagens que têm
alimentos com milho ou com base de milho, porque para eles o mais importante é
a estabilidade das indústrias e a conservação das fontes de trabalho. Se
rotulassem e as pessoas tomassem consciência dos perigos do milho transgénico,
as vendas cairiam a pique, muitos empreendimentos quebrariam e muita gente ficaria
sem trabalho. Ainda que isso implique o declínio da saúde da sua nação. A
prioridade são os números, a “rentabilidade”. Mas tenho-me percebido que no
Brasil a rotulação já está nos alimentos que contêm milho. Trata-se de um
triângulo com um T no seu interior. É um grande avanço e uma mostra de respeito
para com os direitos dos consumidores. Porém, por aqui, nesse sentido, todavia
estamos na pré história. Mais tarde ou mais cedo, chegará. Porque nada nem
ninguém pode parar MARÉ DAS MUDANÇAS.
Então podemos usar arroz integral como base ou
então outros cereais como: millet, quinoa, cevada ou bulgur. Os cereais
integrais levam mais tempo a cozinhar que os cereais refinados industrialmente.
Há que praticar e praticar para conseguir uma boa cozinha macrobiótica ou
saudável. Empregaremos a expressão
“macrobiótica” por convenção, para entender do que estamos a falar. 50-60% de
cereais integrais bem preparados com água mineral e sal marinho. Devem ser
muito bem mastigados inclusive até 80-100 vezes cada bocado até que o alimento
fique com consistência líquida. Só assim nos asseguraremos que temos completado
o 1º tempo digestivo, o tempo bocal. A saliva tem potentes acções químicas
sobre os hidratos de carbono complexos, que abundam nos cereais. Os cereais têm
no estado cru, um Ph levemente ácido. Porém ao cozinhá-los em fogo muito lento
com um pouco de sal marinho e ao mastigarmos cuidadosamente, o seu Ph torna-se
alcalino, sobretudo pela acção alcalinizante da ptialina. Face a uma gastrite,
onde há uma inflamação permanente das paredes internas do estômago, a
mastigação deve ser muito mais atenta e cuidadosa. O alimento deve então
liquefazer-se completamente antes de ser deglutido. Em casos severos mastigar
mais e inclusivamente 200 a 250 vezes cada bocado (para o arroz e cereais
integrais). É só uma questão de HÁBITO, tudo se aprende se nos treinarmos.
Desta forma o sabor de cada bocado será cada vez mais doce e alcalinizar-se-á
tanto que inibirá a acidez gástrica. É interessante que os fármacos que se empregam
na gastrite são em muitos casos alcalinos. O alcalino neutraliza e cura a
acidez. Mas se em vez de alcalinizar com fármacos que têm custos económicos e
vitais (e efeitos secundários) preferimos alcalinizar com uma dieta alcalina e
muita mastigação. Também o sal marinho usado com moderação alcaliniza os
alimentos e todos os fluídos corporais. Somos 80% de água alcalina, não 80% de
água doce engarrafada. E o componente que invariavelmente está em todos os
fluídos biológicos é o NaCl (cloreto de sódio). Ou seja, sal natural. Apesar da
má propaganda que fizeram ao sal e ao medo pela sua suposta responsabilidade no
aparecimento da hipertensão arterial. Não podemos viver sem sal. A hipertensão
só ameaça os que se alimentam na base de derivados animais. Os verdadeiros
vegetarianos não padecem de hipertensão apesar de usarem sal. Trata-se de outro
mito, de outro paradigma errado. E a ponto de se derrubar.
O cereal é o alimento base. É a base da cura. Isto
deve ser compreendido claramente. Sem cereal base não há cura. Não se trata de
comer saudável ou natural. Trata-se de compreender que assim o estabelece a
Ordem. O ser humano pode comer de tudo e assimilar quase tudo. Mas o maior
nível de equilíbrio e saúde recebe-os do cereal. Por alguma razão temos 20
molares num total de 32 dentes. Os molares “moem”, como as mós de um moinho. Os
moinhos “mastigam” o trigo e o convertem em farinha. Os nossos dentes são os
nossos moinhos naturais. Mas não se limitam a triturar, a reduzir tudo a
mínimos fragmentos, mas também o misturam com os factores bioquímicos que
compõem a saliva, como enzimas, sais minerais e claro água, para que a papila
esteja com o nível exacto de hidratação antes de “cair” na mucosa gástrica. Mas
como queremos evitar esforços preferimos que o moinho mecânico faça o trabalho.
E por isso todos nós gostamos de farinha. Branca, integral ou de mistura. Para
evitar o esforço e o trabalho de mastigar inclinamo-nos para usar o cereal
mastigado pela máquina. Mas a mastigação mecânica do moinho não chega ao nível
óptimo da mastigação bocal fisiológica. Por isso é melhor comer grãos cozidos
inteiros e mastigá-los do que comer grãos processados em forma de
farinhas. Podemos comer todo o volume de
arroz ou cereais inteiros que desejemos sempre e quando o mastiguemos muito
bem, e em caso de problemas digestivos, isto é particularmente importante. Não há limites nas quantidades de alimento
principal. Uma parte deste prato principal pode ser consumida em forma de
subprodutos de cereais integrais, como bolos moídos, arepas, tortilhas
de milho ou arroz ou pães e bolos. Sempre e quando o estômago o tolere. Em caso
de impulso severo de gastrite todos os cereais deveriam ser consumidos em forma
de grãos bem cozidos e tenros ou inclusivamente liquidificados em forma de
cremes ou sopas. Logo que passe o impulso e melhorem os sintomas podem usar-se
formas mais atractivas de consumir os cereais.
O cereal é sagrado para o ser humano. A sua
correcta absorção, purifica-o, eleva-o espiritualmente, torna-o formoso e
sábio. Dá-lhe um tipo de força vital subtil que outros alimentos não têm.
Devemos estar profundamente agradecidos e emocionados cada vez que comamos o
nosso arroz integral ou o nosso milho ou a nossa aveia. São os alimentos
superiores para o homem e a ferramenta dietética mais poderosa para alcançar a
cura da gastrite ou de qualquer outra doença. Compreendendo isto muito
claramente, não comeremos nunca “mecanicamente” o nosso arroz, queixando-nos da
pouca “variedade” ou da pouco gostosa preparação. Recorde o leitor que a minha
sugestão é por uma grande paixão na arte de cozinhar. Se tiver mau sabor é
porque não está bem preparada. Se estiver bem preparada com amor, com
consciência, com intenção e com o adequado equipamento e experiência, o arroz e
suas diferentes variações deverão dar-nos diariamente regalias e sabores
requintados. E assim cada dia pode ser uma festa. Pelo menos assim é para mim e
para milhões de seres humanos que comem uma dieta à base de cereal integral há
dezenas de anos e com maravilhosos resultados. É, portanto, essencial comer e
mastigar o arroz ou o millet ou a quinoa com essa consciência e com esse
espírito de gratidão, amor e sentir-se um privilegiado por ter tido acesso a
este ensino que nos catapulta para a felicidade e a realização do nosso
completo potencial. Então a doença é uma chave, para abrir a nossa vida a
enormes possibilidades. Por isso devemos estar sempre agradecidos e
entusiasmados porque tudo o que venha agora, se continuamos praticando estas
disciplinas será cada vez mais e mais poderoso. Despertamos. Somos seres
humanos da mais alta categoria biológica e espiritual. Verdadeiramente humanos e,
portanto, amantes da felicidade colectiva e de todas as formas de vida. E isto
o “sentimos” espontaneamente, sem ter de pertencer a nenhuma fraternidade ou
agrupamento filosófico. Simplesmente respeitamos a Ordem e isso de igual forma
ao que se passa com os animais selvagens coloca-nos numa situação de privilégio
aos olhos do Universo.
O resto dos alimentos que compõem o nosso menu
dominam-se alimentos secundários. Incluem uma extensa variedade de vegetais
terrestres e marinhos, leguminosas, sementes e frutos secos, frutas de estação,
peixe magro e ovos do campo. Também uma variedade de condimentos e o uso de
ervas medicinais. Todos estes detalhes deveriam ser recebidos numa consulta
pessoal com algum orientador dietético adequadamente classificado e experiente.
Porém, alimentando-nos simplesmente segundo estes directizes gerais poderemos
curar a gastrite em aproximadamente um mês no máximo dois. Em alguns
casos antes, dependendo da nossa vontade e entusiasmo e também do surgimento
das emoções que geram a cura sem nos faltar: uma fé esmagadora e uma imensa
gratidão.
Resumindo, deveremos
alimentar-nos com um prato consistente de 2/3 de arroz integral e 1/3 de
alimentos secundários. Dentro dos alimentos secundários, deve haver sempre
vegetais cozidos e crus (numa proporção 3/4-1/4), algumas algas marinhas para
dar cálcio, ferro, magnésio e outros sais vitais para uma saúde óptima,
proteínas vegetais em forma de leguminosas bem cozidas, sementes levemente
tostadas (sésamo, girassol, linho, nozes, castanhas, amêndoas, amendoins).
Ocasionalmente (uma ou duas vezes por semana) um pouco de peixe branco e um
pouco de fruta local fresca ou levemente cozida. Durante os impulsos o prato
deve ser muito simples e estricto. Só arroz, sésamo e vegetais no vapor. A
seguir aos impulsos, voltar a empregar uma variedade de sabores e texturas. É
importante usar produtos fermentados para termos enzimas e bactérias que
beneficiem a digestão, como os lacto-bacilos.
O melhor produto que conheço é o miso, uma pasta de soja usada há
milhares de anos no Extremo Oriente. Também o molho de soja de boa qualidade e
o tempeh. Se não for possível na nossa zona conseguir estes produtos usar
pickles de vegetais em salmoura como o chucrute. Tudo deve ser muito bem
mastigado e respeitando a proporção entre cereal e complementos. A inversão das
proporções conduz a um excesso de yin e assim a inflamação da mucosa que também
está muito yin, continuará inflamada apesar de estarmos comendo muito
saudavelmente e muito macrobioticamente. A proporção, a mastigação, a qualidade
dos alimentos e também as emoções correctas que conduzem à cura. É um pouco
difícil ao princípio, mas se formos persistentes e estivermos determinados a
curar-nos, em um mês ou no máximo em dois receberemos a grande caixa de
primeiros socorros da cura. Melhor dito da auto-cura. E sentiremos a satisfação
imensa de o termos feito nós próprios. Sem ajuda técnica. Apenas apelando às
forças curativas da natureza. E a sua mais gloriosa síntese para o humano: o
cereal, o bendito cereal ao qual não deixo de agradecer todos os dias da minha
vida. E se fizerem o mesmo a vossa transformação fisiológica será imparável e
poderosa. A cura começa na mente e sustenta-se com a mente. Leiam a vossa folha
de propósitos/objectivos para afirmar a vossa determinação e programar o vosso
inconsciente. Assim tereis 100% de probabilidades de ter êxito. E devereis
escrever-me logo a seguir umas linhas contando-me da vossa nova vida saudável.
Não duvidem. Vocês o farão. Repitam em voz alta por favor= Fá-lo-ei.
Fá-lo-ei. Tenho o potencial e a vontade infinita. Obrigado. Obrigado. O
Universo conspira a meu favor.
Dr. Martín Macedo - médico, Uruguai, 2013