Thursday, July 6, 2023

 


O YIN E O YANG DA COZINHA DIÁRIA

por: Martín Macedo

Teoria e prática devem ir juntas. E ambas são de capital importância. As pessoas mais concentradas preferem os aspectos técnicos e descuidam a teoria, enquanto as pessoas mais intelectuais aprofundam naturalmente os aspectos teóricos, deixando um pouco de lado os aspectos práticos. Temos uma tendência a inclinar-nos mais para um lado ou para outro de acordo com a nossa natureza. Mas não nos devemos deixar levar pela inércia das nossas preferências, devemos compreender que para ter um desenvolvimento global é necessário ingressar no lado que não nos atrai tanto.

É muito difícil ter um desenvolvimento equilibrado. Tendemos fortemente a desenvolver o aspecto yin ou o aspecto yang, ou seja, prática ou teoria. Devemos trabalhar o lado contrário da nossa preferência pelo menos como forma complementar. Até agora temos trabalhado principalmente os aspectos teóricos. Está na hora de ingressar nos importantíssimos detalhes práticos.

Antes de tudo devemos reconsiderar que quase todos os componentes da nossa dieta são de origem vegetal, ou seja, que são yin. E no âmbito dos vegetais os mais neutros, os menos yin, são os cereais. E dentro dos cereais o que melhor combina ambas as energias é o arroz integral. Por isso o arroz deve estar diariamente, se possível, nas nossas refeições. Como é possível criar condições muito yang, partindo de componentes vegetais, de carácter dilatador, expansivo? Como é possível criar condições muito yang? Todos nós desejamos criar essas condições muito yang, como a força física e emocional, rapidez, precisão, autoconfiança, resistência, determinação, uma grande fé, magnetismo, êxito e atracção.

Em macrobiótica temos um princípio sagrado: se comes yang tornas-te yang - se comes yin, tornas-te yin. Se queremos ser muito yang, muito fortes, devemos comer alimentos yang. Então, pareceria mais lógico ir buscar estes componentes ao reino animal, onde o yang abunda. O problema está em que os alimentos animais são extremamente yang (salvo o peixe). Além do mais contêm elevados níveis de gordura que são extremamente yin, e por isso o alimento animal é delicioso e a tendência geral é abusar no seu consumo. Ao consumirmos quantidades importantes de alimento animal, absorvemos ambos os extremos, mas como o yang predomina, este desequilíbrio extremo irá levar a uma avidez compulsiva por doces, líquidos, álcool, café, chá-mate e outros yin fortes. O homem oriental sempre soube isto de forma intuitiva e sempre limitou o consumo de pratos de origem animal. Enquanto os ocidentais procuram avidamente a força yang nos alimentos animais, sem reflectir muito sobre as consequências sobre a sua saúde física e espiritual. O ocidental quer resultados rápidos. É demasiado yang para parar e fazer uma introspecção.

Porém, nós procuramos um milagre: produzir um resultado muito yang, partindo de componentes yin.

O alimento animal tem excesso de sódio enquanto que o vegetal tem excesso de potássio. O equilíbrio de sódio e potássio é o que conta. Portanto, para yanguizar os vegetais yin é imprescindível adicionar sódio em forma de sal marinho, miso, shoyu, gomásio, umeboshi e outros condimentos. Por outro lado, podemos yanguizar mediante o uso do fogo e do tempo de cozedura. Os nossos pratos devem ser cozinhados bastante tempo em fogo muito lento. Ainda assim, os vegetais têm uma essência yin e a sua capacidade de assimilar yang não é muito grande. Por isso é recomendável ingerir um pouco de peixe de vez em quando para adicionar yang. E os pratos de vegetais, feijões, sementes e outros ricos em potássio devem consumir-se em quantidades pequenas. Se o fizermos em quantidades importantes afastamo-nos das condições muito yang que queremos criar. Por isso, o tradicional foi empregar cereais cozidos em volumes maiores e vegetais e outros complementos em volumes menores. Contudo, para absorvermos todos os benefícios vitais do cereal, sobretudo se o comermos em volume importante, devemos mastigá-lo muito bem. De outra forma não o assimilaremos bem, sobretudo por parte das pessoas de constituição frágil. O uso do sal marinho constitui um tema delicado, já que a sua força contractiva é extremamente poderosa. Deve-se consumir em quantidades moderadas. O resultado é um yang suave que nos situa num grau de equilíbrio energético. Para produzir o resultado muito yang que desejamos e para o fazer de forma segura, devemos juntar mais dois factores: tempo e actividade. A perseverança, a vontade é o segredo para acumular a energia positiva de forma gradual. Passados um ou dois meses de prática constante começa-se a perceber efeitos poderosos. Porém, se quisermos acelerar o processo de mudança para condições mais vigorosas, o outro aspecto essencial é a actividade, o exercício físico. Sem exercício físico, mesmo fazendo bem tudo o resto, a taxa de mudança faz-se infinitamente mais lenta e corremos o risco de começar a duvidar sobre o sentido dos nossos esforços. Se quisermos produzir um resultado muito yang partindo de algo yin, a actividade física é essencial. As pessoas inactivas, preguiçosas, que sempre procuram a forma mais cómoda de fazer as coisas, têm muitas dificuldades no momento de avançar na sua recuperação e muitas vezes abandonam por falta de “resultados”. Para eles há outro caminho mais rápido e efectivo: a violência terapêutica. Há aqui novamente o paradoxo: o que procura o fácil, acaba encontrando o mais difícil, o mais duro, o mais violento. Enquanto que o caminho aparentemente mais difícil e esforçado produz paz e tranquilidade. Yin muda para yang e yang muda para yin. Devemos ser sábios para o compreender.

O ser humano realizado, tranquilo, feliz e extremamente saudável, tem o yang acumulado no seu interior e o yin no exterior. Aparentemente pacífico, tranquilo, humilde, calmo, compreensivo e carinhoso. Porém, internamente forte, decidido, valente, invencível, capaz de enfrentar qualquer desafio e extremamente adaptável e resistente.

O homem vulgar tem as energias invertidas. Tem o yang no exterior e o yin no interior. Desta forma aparentemente muito activo, enérgico, altivo, competitivo e agressivo. Tem o porte de um conquistador. Porém, internamente é muito frágil, sentimental, fácil de enganar, inocente, carente de autodisciplina, pobre em autoestima, medroso, desconfiado, ansioso e compulsivo. Não se aceita a si próprio e se auto castiga para tentar corrigir as tendências negativas que não pode eliminar. Considera-se separado de todos os demais e luta para ter um quinhão de poder onde encontrar segurança, ainda que seja de forma temporária. Aqueles que procuram a sua força no reino animal, acabam acreditando que são unidades separadas que devem sobreviver lutando até ao fim. Enquanto que aqueles que a procuram no reino vegetal, desenvolvem gradualmente uma compreensão universal, inclusiva, unificando toda a vida do Universo e cooperando para que todas as formas vivas alcancem a sua plenitude. Uma vez mais a fraqueza vence a força, a suavidade a prepotência e a paz a violência.



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