TRIGO SARRACENO –
um cereal de Inverno
A HISTÓRIA DO “PATINHO FEIO” ESQUECIDO
O “TRIGO NEGRO” VÍTIMA DE UM APARTHEID ALIMENTAR
Pilar da alimentação dos camponeses
europeus na Idade Média e essencial até à Iª Grande Guerra Mundial, dos EUA até
à Rússia, o trigo sarraceno, também chamado de trigo negro, trigo
mourisco e Kacha, é, actualmente, quase exclusivamente utilizado
para fazer crepes, e pouco mais!
É vítima de um apartheid alimentar, tão
radical quanto injusto, em benefício do seu falso primo: o trigo branco.
Pensava-se, nos anos 1970 a 1980, que no
fundo, o desaparecimento do trigo sarraceno não tinha nenhuma importância – o
que importa que as pessoas prefiram o trigo branco? este trigo que nos dá uma
farinha bem branca, com a qual se fazem as baguetes, os brioches crocantes! … e
as pessoas têm o “direito” de não mais comer este feio “trigo negro”,
primitivo, barato!
Deixamos, pois, desaparecer o trigo
sarraceno dos nossos campos, dos nossos ecrãs e dos nossos pratos … sem
reflectir … e a produção passou das 400.000 toneladas para as 20.000, entre
1918 e 1964 nos EUA, ou seja, teve um decréscimo de 95% …
E foi só depois de várias décadas que nos apercebemos o porquê dos nossos antepassados cultivarem e consumirem sarraceno, mais do que trigo branco … os seus benefícios deveriam ter sido óbvios … mas nós não o conseguimos ver …
BENEFÍCIOS PARA A AGRICULTURA
Os benefícios do sarraceno tornam-se
evidentes logo que o semeamos.
Tem a propriedade de “abrir” o solo e de
o limpar de ervas más - os imensos campos agrícolas da Rússia, e sobretudo dos
EUA, não foram limpos com herbicidas, mas com sementes de sarraceno, que os
primeiros colonos americanos tiveram o cuidado de levar com eles, e lhes
salvaram a vida.
Enriquece naturalmente o solo com
fosfato – o que evita o derramamento de fertilizantes químicos com o risco de
envenenamento dos rios e lençóis freáticos. Foi o que tornou possível o
cultivo, e a valorização de milhares de hectares de terras áridas: cultiva-se o
sarraceno nas estepes da Rússia, da China, do Cazaquistão, e nas zonas
montanhosas onde os cereais não crescem – que, no plano botânico, não é um
cereal, mas um pseudo-cereal, tal como a quinoa e o amaranto.
As nossas modernas “agriculturas biológicas”
descobriram uma outra razão para a antiga popularidade do trigo sarraceno: ele
reduz as populações de Verticillium dahliae, uma bactéria que quebra o
rendimento e a qualidade das batatas. O trigo sarraceno permite, pois, evitar
os tratamentos modernos contra esta doença, a verticiliose, que são pouco
eficazes e muito poluentes - compreende-se, assim, o porquê dos nossos avós,
que praticavam a rotação das culturas, semearem sarraceno antes de plantar
batatas no ano seguinte …
Enfim, o sarraceno atrai os
polinizadores e alimenta uma fauna diversificada: é o garante de uma sã
biodiversidade nos campos. As abelhas adoram-no e fabricam com ele um dos
melhores méis que existem, escuro e muito saboroso. Talvez seja por isso que o
sarraceno não era apenas popular no Ocidente. Os povos asiáticos deliram com
ele, pois é com o trigo sarraceno que fabricam as deliciosas massas japonesas
chamadas Soba, também muito populares na Coreia. Nos países dos
Himalaias, faz-se uma espécie de caldo (papas). Na Europa de Leste e na Rússia
faz-se a Kacha (grãos descascados e torrados).
Também do ponto de vista nutritivo e culinário, o sarraceno é bem mais interessante do que o trigo branco. Tem um rico sabor a avelã. Não contém glúten. Pode ser consumido por pessoas celíacas (intolerantes ao glúten) e por pessoas hipersensíveis ou doentes que procuram reduzir o seu nível de inflamação.
BENEFÍCIOS PARA A SAÚDE HUMANA - São inumeráveis.
Se substituirmos uma parte de farinha de
trigo por farinha de sarraceno iremos emagrecer, porque o sarraceno sacia mais
rapidamente. Contém mais fibra solúvel e tem, pois, um efeito benéfico sobre os
intestinos. O sarraceno é bem mais digesto que o trigo. Os povos que comem
sarraceno em vez de trigo têm menos problemas de peso, menos diabetes, menos
cancros. É muito proteico e energético, aquece as extremidades e é um “médico-alimento
específico” dos rins.
Numerosos estudos procuraram saber
porquê. No entanto, parece ser a sinergia entre os numerosos componentes do
sarraceno que explicam isso: o sarraceno contém muitos minerais, nomeadamente
magnésio, fósforo, manganésio, zinco, vitaminas do complexo B e muitos
antioxidantes.
Contém duas a doze vezes mais de fenóis, antioxidantes, que o trigo, a cevada e a aveia, e é muito rico em flavonoides, derivados da catequina e da epicatequina (anticancerígenos). A indústria farmacêutica extrai vários antioxidantes das flores e folhas da planta do trigo sarraceno, incluindo rutina, quercetina e proanthocyanes.
CONSERVAÇÃO
A farinha de sarraceno é muito mais frágil que as outras. Ela conserva-se no frigorífico ou, melhor, no congelador. Mas de preferência deveríamos moer o grão na hora, com o moinho de cereais ou de café.
AUTOR DE REFERÊNCIA
· - Gérard Wenker – “Sarrasin, kacha, blé
noir, etc.”
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