Thursday, July 13, 2023

 


QUEM SOU EU?

O ÚLTIMO DESEJO DE GEORGES OHSAWA

Tudo muda:
Um bebé torna-se adulto, o peito duma donzela esvanece-se como uma taça partida.
O amor ardente cor-de-rosa perde a sua vivacidade e fragância, tornando-se uma sepultura sob a chuva e o vento.
O corpo duma namorada, depois da sua morte, é apenas uma peça de carne.
Ah!, tudo muda.
A neve branca, quando derrete, enche a cidade de sujidade.
O belo torna-se feio.
O alegre, triste.
A maior alegria transforma-se na maior tristeza.
As montanhas dão lugar aos campos, os campos ao oceano.
Tóquio é reduzido a cinzas, Roma a pedra.
A glória e o sonho do império egípcio transformam-se num deserto.
O Sol escurece, a terra desaparece.
Entropia: as estrelas estiolam-se, as coisas transmutam-se. A luz torna-se escuridão, a vida morte.

Quem és tu, oh!, quem és tu?
Tira o teu véu, mostra o teu rosto!
Este grande palco do Universo: a formusura torna-se fealdade, a claridade escuridão, o calor, frio, o Verão, Inverno …
A cada minuto, a cada segundo, ininterruptamente, a cada milionésimo de segundo, sem cessar, tu mudas.

Quem és tu?
Todos partiram, amados, crianças, amigos, aqueles que encontramos e por quem nos interessamos.
Dinheiro, alegria e felicidade.
Sucesso, casa, país, dias da minha infância,
Flores, neve, todas as dificuldades e sofrimentos.
Todos destruíste e aniquilaste.
Que grande fingidor!
Que grande mágico!

És Deus? Sim!
Conduzes à tristeza todos aqueles que se sentem felizes.
Tu, sem misericórdia, matas os que estão vivos.
És Deus? Não!
Deus e o Diabo são as minhas mãos direita e esquerda.
Eu sou o Universo inteiro!
Eu sou o Eterno.
Eu estou sempre em movimento!

Aqueles que dão graças a Deus … como são loucos!
Não formam eles e Deus um todo?
Os amigos podem ser os meus inimigos e os inimigos os meus amigos.
Os amigos podem estragar-nos com o seu coração afável;
Os inimigos podem fortalecer-nos com a sua resistência.
Amar os teus amigos pode ser odiar os teus amigos.
Aquele que fortalece os seus amigos e inimigos é aquele que os ama de verdade.
Acarinhares os teus amigos e inimigos é matá-los a todos.
César foi morto por Brutus.
Aqueles que têm dinheiro são destruídos pelo dinheiro.
Aqueles que têm conhecimentos são destruídos pelo conhecimento.
Aqueles que se fazem de Deus são destruídos por Deus.
Olha para aqueles que possuem bombas atómicas.
Olha para o Japão, país de Buda, o Japão.
O reino de Deus (eu vergonhoso), assim chamado.
Um tal amor não é senão ódio.
O amor que só abraça aquilo e aqueles de que gosta não passa de egoísmo.
Disse Confúcio: “nunca conheci ninguém que amasse ´o caminho da vida´ e que gostasse de amar uma mulher”.
Oh! Pobre Confúcio, porque separas a mulher de ´o caminho da vida´?
Porque o fizeste, um homem grande como tu foi odiado pela sua própria mulher.
Escreveste: “é muito difícil alimentar um pequeno homem ou mulher”.
Estavas a dizer que o sofrimento te fortalece embora te desagradassem a mulher ou o homem pequenos.
Esse era o teu defeito.
Devo afirmar: amo o Diabo como amo Deus e também amo Deus como amo o Diabo.
Gosto do caminho da vida e também gosto de mulheres.
Gosto daquele que tem e daquele que não tem.
Gosto mais das mulheres que me traíram do que da minha própria querida amada.
Gosto mais da feia mulher pedinte, cujo nariz e boca se desvaneceram e cujos braços e pernas estão retorcidos pela lepra: gosto mais dela do que da minha bela amada.
Gosto mais de uma bola de arroz bolorento do que uma montanha de delícias e vinhos doces.
Gosto mais de saborear do que um estomago cheio.
Gosto mais das crianças de um estranho do que das minhas.
Gosto mais de um homem mau do que um homem bom.
Fiz um amigo de um criminoso com nove condenações.
Dormi com um assassino que tinha treze condenações prévias.

Sou aquilo de que gosto através daqueles que amo.
Sou o Universo.
Sou o Infinito.
Sou o Único e sou o Todo.
Sou Eterno.
Olho Deus lá em baixo e o Diabo ainda mais abaixo.
Sou o Criador de Deus e do Diabo!
Sou o Criador do próprio Infinito.
Sou o Princípio da Criação.
Sou Vazio.
Sou Nada.
Desconheço o meu nome.
Não tenho nome.
Sou aquele que ninguém conhece.
Sou Todo, a Unidade e o único que eu próprio conheço.
Sou aquele que sabe que nada existe senão Eu mesmo.
Sei que cada um dos triliões de pedaços de mim chama a si mesmo Eu, e no minuto seguinte desaparece coo um nevoeiro.
Um nevoeiro chamado ´Eu´, efémero.
Não conheço ninguém que me chame pelo meu nome completo.
Ouvi Emerson chamar-me “alma suprema”.
Também ouvi alguém dizer acerca de mim “verdade”, mas nunca ninguém veio à minha morada.
E não existe ninguém que brinque comigo de manhã até à noite.
Oh! Que maravilhoso, que interessante!
Ninguém me conhece, embora todos me conheçam.
Não conheço ninguém, embora cada um seja um dos triliões de mim.
Todos são e cada um é.
Quem sou eu? Quem sou eu realmente?
Eu sou Ghandi e sou o hindu de 25 anos que disparou sobre Ghandi.
Quando estou dividido como indivíduo, eu não sou eu.
Quando eu não sou eu, sou eu todavia.
O eu dividido é efémero, mas o meu Eu dividido é ainda mais efémero.
Cada uma das metades do Eu dividido luta contra a outra até que todos estejamos mais e mais divididos e formemos uma história efémera a que chamamos ´História´.
Quando voltamos a juntar todos esses pedaços, eles formam um outro eu efémero a que chamamos eu.

Oh! quem sou eu?
Sou aquele que toda a gente cohece sem que ninguém conheça.
Sou aquele que é difícil de ser.
Sou aquele que é impossível de ser.
Sou não existência aqui.
Sou impossibilidade e sou maravilha.
Eu sou ser, em qualquer lugar, em qualquer tempo.
Eu sou ser, para aquele que tem a capacidade de não estar em lugar algum.
Eu sou eu, alguém que tem dificuldade em ser, impossível de existir e que permanece em lugar nenhum.
Sou Alice no País das Maravilhas.
Sou o ser mais interessante do mundo.
Não conheço ninguém mais interessante do que eu.
Torno todos aqueles que me conhecem felizes, livres para habitarem no Reino dos Céus.
O Reino dos Céus está cheio de impossibilidades e cheio de agradecimentos.

Portanto, eu sou eu … homem e mulher, ele e ela, ele é o meu yang, ela o meu yin.
Sou o imortal e o eterno.
Georges Ohsawa



(Referência: IMP 2002/2003)





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